sexta-feira, 31 de julho de 2009

O teatro como exercício para o pensamento

Fundo preto, ausência de cenário, apenas uma cadeira da mesma cor e, sentada nela, Fernanda Montenegro com uma camisa de botões branca. Acima dela, uma luz que incide sobre seu rosto durante toda a encenação de 'Viver Sem Tempos Mortos', monólogo que tem como texto cartas e apontamentos autobiográficos de Simone de Beauvoir. Em pré-estreia para convidados ontem no Oi Futuro (a estreia acontece hoje), o espetáculo finalmente chega ao Rio obrigado a mostrar a cariocas o que nele há de tão especial.
São sutis as descobertas: a primeira delas está no texto, um relato envolvente e pouco emotivo, pontuado por considerações ímpares da mulher de Sartre sobre a condição do feminino, do masculino e das duas pontas capazes de uni-los ou separá-los. Ali, nos escritos da filósofa, passeiam divagações sobre o tempo e a liberdade, numa clara sinalização de que um bom conselho é mesmo viver sem olhar tanto para trás, abandonando o passado. Como sentencia a peça, viver sem tempos mortos, ciente de que o que vem pela frente está intimamente ligado com tudo o que já foi feito. No que é dito, há espaço ainda para considerações sobre o amor - o carnal, o baseado na admiração intelectual. E em tudo, uma atriz corajosa, capaz de se entregar ao jogo proposto pelo diretor Felipe Hirsch: Fernanda não se levanta, pouco se movimenta, arrebata no minimalismo, surpreende na delicadeza, no espírito jovem, ainda contestador das convenções, no prazer de atuar e ser outra. E na outra ser ela e dar um pouco de si a todos. Econômico, rico e inteligente, o monólogo que a atriz apresenta dura 60 minutos, que passam rápido mas devem durar uma eternidade no pensamento dos espectadores. Teatro simples e eficiente. Recompensador. Cotação:***

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